O Quarto Vermelho
(H.G. Wells)
“Posso
assegurar-lhe”, disse eu, “que somente um fantasma bem tangível poderá me
assustar.” E postei-me diante da lareira, com meu copo na mão.
“A
escolha é sua”, disse o homem do braço mirrado e lançou-me um olhar de soslaio.
“Vinte
e oito anos”, disse eu, “já vivi e nunca vi um fantasma.”
A
velha senhora estava sentada, olhando fixamente para o fogo, os olhos opacos
bem abertos. “É”, disse subitamente, “e há vinte e oito anos você vive e nunca
viu uma casa como esta, é verdade. Há muitas coisas para ver quando ainda se
está com vinte e oito anos.” Ela balançou vagarosamente a cabeça de um lado
para o outro. “Muitas coisas para ver e lamentar.”
Eu
tinha uma leve suspeita de que os dois velhos estavam tentando acentuar os
horrores espirituais de sua casa mediante seu zunido insistente. Coloquei meu
copo vazio na mesa e dei uma olhada à volta da sala; tive um vislumbre de mim
mesmo, diminuído e disformemente alargado, no antigo e estranho espelho no
extremo da sala. “Bem”, disse eu, “se eu vir algo esta noite, ficarei mais
sábio. Pois vim tratar do caso com espírito aberto.”
“A
escolha é sua”, disse o homem do braço mirrado novamente.
Ouvi
o som de uma bengala e passos trôpegos nas lajes do corredor externo, e a porta
rangeu nas dobradiças quando um segundo velho entrou, mais curvado, mais
enrugado, mais idoso ainda do que o primeiro. Ele se apoiava em uma única
muleta, seus olhos estavam cobertos por uma sombra e seu lábio inferior, meio
repuxado, pendia pálido e estriado de rosa de seus dentes estragados e
amarelados. Ele dirigiu-se imediatamente para uma poltrona no lado oposto da
mesa, sentou-se desajeitadamente e começou a tossir. O homem do braço mirrado
lançou ao recém-chegado um breve olhar de total aversão; a velha ignorou sua
chegada e permaneceu com os olhos fixos no fogo.
“Eu
disse: a escolha é sua”, disse o homem do braço mirrado, quando o outro velho
parou de tossir por um momento.
“A
escolha é minha”, respondi.
O
homem da sombra pela primeira vez deu-se conta de minha presença e pendeu
momentaneamente sua cabeça para trás e para os lados, para observar-me. Pude
ver, por um instante, os seus olhos, pequenos, brilhantes e avermelhados. Então
ele começou a tossir e a cuspir novamente.
“Ora,
por que você não bebe alguma coisa?”, disse o homem do braço mirrado,
empurrando a cerveja em direção ao outro. O homem da sombra encheu um copo com
um braço trêmulo que derramou a metade do líquido na mesa de pinho. Uma sombra
monstruosa dele rastejava na parede e fazia troça de seus gestos enquanto se
servia e bebia. Devo confessar que não imaginava encontrar esses curadores
grotescos. Para mim, existe algo de inumano na senilidade, algo de rastejante e
atávico; as qualidades humanas parecem abandonar imperceptivelmente os velhos,
dia após dia. Aqueles três fizeram-me sentir pouco à vontade, com seus
silêncios sombrios, seus corpos encurvados, sua clara hostilidade tanto com relação
a mim quanto entre si.
“Se”,
disse eu, “vocês me levarem ao seu quarto mal-assombrado, eu me instalarei
confortavelmente lá.”
O
velho da tosse atirou a cabeça para trás, tão subitamente, que dei um salto, e
lançou-me um outro olhar de seus olhos inflamados por debaixo da sombra; mas
ninguém me respondeu. Esperei um minuto, fitando-os um a um.
“Se”,
disse eu, um pouco mais alto, “se vocês me levarem a esse seu quarto
mal-assombrado, eu os livrarei do trabalho de me fazerem sala.”
“Há
um candeeiro na prancha do lado de fora da porta”, disse o homem do braço
mirrado, olhando para meus pés enquanto falava. “Mas se você for ao quarto
vermelho esta noite...”
“Justamente
esta noite!”, disse a velha.
“Você
irá sozinho.”
“Muito
bem”, respondi. “E onde fica?”
“Vá
pelo corredor”, disse ele, “até chegar a uma porta, e além dela há uma escada
em caracol e na metade dela há uma plataforma e outra porta coberta com uma
baeta. Atravesse-a e siga pelo corredor até o fim. O quarto vermelho fica à
esquerda, logo adiante.”
“Entendi
direito?”, disse eu, repetindo as instruções. Ele me corrigiu em um ponto.
“E
você vai mesmo?”, disse o homem da sombra, olhando novamente para mim, pela
terceira vez, com aquele estranho, bizarro repuxo no rosto.
(“Justamente
esta noite!”, disse a velha.)
“Foi
para isso que vim”, disse eu e me dirigi para a porta. Enquanto o fazia, o
velho da sombra levantou-se e cambaleou em volta da mesa, para aproximar-se dos
outros e do fogo. Na porta, virei-me, olhei para eles e vi que haviam se
juntado, escuros, contra o fogo da lareira, encarando-me sobre seus ombros, com
uma expressão concentrada em seus rostos envelhecidos.
“Boa
noite”, disse eu, abrindo a porta.
“A
escolha é sua”, disse o homem do braço mirrado.
Deixei
a porta aberta até que a chama da vela ficasse bem acesa e então a fechei e
caminhei pelo corredor gelado e ressonante.
Devo
confessar que a singularidade desses três velhos pensionistas a quem a
proprietária encarregara de cuidar do castelo e a mobília antiquada da sala do
zelador na qual eles haviam anteriormente se reunido afetou-me, a despeito de
meus esforços em manter minha frieza de espírito. Eles pareciam pertencer a uma
outra era, uma era remota, quando as coisas espirituais eram diferentes das
nossas, menos claras; uma era em que se acreditava em presságios e em bruxas —
e acima de tudo em fantasmas. Sua própria existência era espectral; o corte de
suas roupas, estilos nascidos de cérebros mortos. Os ornamentos e objetos úteis
da sala a sua volta eram fantasmáticos — pensamentos de homens desaparecidos,
que ainda assombravam, mais do que dele participavam, o mundo de hoje. Mas com
um esforço consegui despachar tais pensamentos. O corredor subterrâneo,
comprido e atravessado de correntes de ar, era gelado e empoeirado, minha vela tremulava
e fazia as sombras tremerem e se agitarem. Os ecos soaram acima e abaixo da
escada em caracol, e uma sombra veio de baixo, velozmente em minha direção e
outra correu à minha frente, para a escuridão acima. Cheguei ao patamar e parei
ali por um instante, à escuta de um farfalhar que imaginei ter ouvido; então,
convencido pelo silêncio absoluto, abri a porta com a baeta, detive-me no
corredor.
O
que vi não era bem o que eu esperava, pois o luar, entrando pela grande janela
da escadaria imponente, realçava tudo com uma sombra nítida e negra ou com uma
luz prateada. Tudo estava em seu lugar: parecia que a casa fora abandonada no
dia anterior, em vez de dezoito meses atrás. Havia velas nos soquetes das
arandelas e a pouca poeira que cobria os tapetes ou o soalho encerado
distribuíra-se de modo tão uniforme que era invisível ao luar. Quando estava
prestes a entrar, parei abruptamente. Um conjunto de bronze estava em pé no
patamar, oculto de mim pela aresta da parede, mas sua sombra caía com uma
nitidez surpreendente sobre a almofada branca da porta e deu-me a impressão de
alguém se agachando para me acometer. Fiquei rígido e imóvel por uns segundos,
talvez. Então, com a mão no bolso onde estava meu revólver, avancei e descobri
um Ganimedes e uma águia reluzindo ao luar. Aquele fato,
Por uns momentos, devolveu meu equilíbrio, e um chinês de porcelana sobre uma
mesa de marfim, cuja cabeça girou silenciosamente quando passei, pouco me
assustou.
A
porta do quarto vermelho e os degraus que levavam até ele estavam em um canto
envolto na sombra. Movi minha vela de um lado para outro, para ver claramente
em que tipo de nicho me encontrava antes de abrir a porta. Fora aqui, pensei,
que encontraram meu predecessor, e a lembrança daquela história provocou em mim
uma súbita pontada de apreensão. Olhei de relance sobre meu ombro para o
Ganimedes ao luar e abri a porta do quarto vermelho com certa pressa, com o
rosto meio virado para o silêncio descorado do patamar.
Entrei,
fechei imediatamente a porta atrás de mim, girei a chave que encontrara na
parte de dentro da fechadura e detive-me, a vela levantada acima de minha
cabeça, a examinar o cenário de minha vigília, o grande quarto vermelho do
Castelo Lorraine, no qual morrera o jovem duque. Ou antes, no qual ele começara
a morrer, pois abrira a porta e caíra de ponta-cabeça nos degraus que eu
acabara de galgar. Fora esse o fim de sua vigília, de sua galante tentativa de
vencer a tradição espectral do lugar; e nunca, pensei, a apoplexia se prestara
melhor aos objetivos da superstição. E havia outras histórias mais antigas
ligadas ao quarto, até o início duvidoso de tudo, a história da esposa medrosa
e o trágico fim que sobreveio à brincadeira de seu marido, que pretendia
assustá-la. E, ao olhar à volta do quarto amplo e penumbroso, com suas janelas
de sacada envoltas em sombras, seus nichos e alcovas, era fácil entender as
lendas que brotavam de seus cantos negros, suas trevas seminais. Minha vela era
apenas uma pequena chama na sua vastidão, insuficiente para penetrar no extremo
oposto do quarto e deixava um mar de mistério e insinuações para além de sua
ilha de luz. Decidi fazer imediatamente um exame sistemático do lugar e
dissipar as insinuações fantasiosas de sua obscuridade antes que tomassem conta
de mim. Após verificar se a porta estava realmente fechada, comecei a caminhar
pelo quarto, examinando em volta de cada peça de mobília, enrolando os cortinados
da cama e abrindo totalmente as cortinas. Empurrei as persianas e examinei os
ferrolhos de várias janelas, antes de fechar as folhas, abaixei-me e olhei o
negrume da grande chaminé e bati de leve nos lambris de carvalho escuro em
busca de alguma passagem secreta. Havia dois espelhos grandes no quarto, cada
um com um par de arandelas com velas, e sobre o aparador também havia mais
velas em candeeiros de louça. Acendi todos eles, um a um. Havia lenha na
lareira, uma inesperada gentileza da velha criada, e eu a acendi, para reprimir
qualquer tendência a arrepios, e quando o fogo pegou, fiquei de pé, de costas
para ele e observei novamente o quarto. Eu empurrara uma poltrona coberta de
chintz e uma mesa, para formar uma espécie de barricada diante de mim e sobre
esta depositei meu revólver, logo à mão. Meu exame minucioso fizera-me bem, mas
ainda achei as penumbras mais distantes do lugar e sua absoluta quietude
demasiado estimulantes para a imaginação. Os ecos dos chiados e estalidos do
fogo não eram de molde a me confortar. A sombra no extremo da alcova,
especialmente, possuía aquela indefinível qualidade de uma presença, daquela
estranha impressão de uma coisa viva e à espreita, que brota tão facilmente do
silêncio e da solidão. Por fim, para me acalmar, dirigi-me para ela com uma
vela e convenci-me de que não havia nada material lá. Coloquei a vela no soalho
da alcova e deixei-a nessa posição.
A
essa altura eu já estava em um estado de grande tensão nervosa, embora
racionalmente não houvesse nenhum motivo para isso. Minha mente, contudo,
estava perfeitamente lúcida. Convenci-me de que nada de sobrenatural poderia
acontecer e, para passar o tempo, comecei a costurar alguns versos, à moda de
Ingoldsby, da lenda original local. Uns poucos eu disse
em voz alta, mas os ecos não eram agradáveis. Pelo mesmo motivo também
abandonei, depois de algum tempo, um diálogo comigo mesmo sobre a
impossibilidade de fantasmas e de assombrações. Minha mente retrocedeu às três
pessoas envelhecidas e contorcidas lá embaixo e tentei mantê-la ocupada com
isso. Os vermelhos escuros e os negrumes do quarto me preocupavam; até mesmo
com as sete velas o lugar estava apenas vagamente iluminado. A da alcova tremeluziu
com um golpe de vento, e o bruxuleio do fogo fazia com que as sombras e a
penumbra mudassem e se agitassem incessantemente. Meditando em busca de um
recurso, lembrei-me das velas que vira no corredor e, com um ligeiro esforço,
saí em direção ao luar, carregando uma vela e deixando a porta aberta; retornei
em seguida com dez delas. Coloquei-as em diversos badulaques de louça com os
quais o quarto estava adornado aqui e ali, acendi-as e coloquei-as onde as
sombras eram mais densas, algumas no chão, outras nos nichos das janelas, até
que por fim minhas dezessete velas estavam dispostas de modo que nenhum
centímetro do quarto ficasse sem a luz direta de pelo menos uma delas.
Ocorreu-me que, quando o fantasma entrasse, eu poderia avisá-lo para não tropeçar
nelas. O quarto estava agora envolto em uma luz brilhante. Havia algo de
realmente alegre e tranqüilizador naquelas pequenas chamas flutuantes, e
cheirá-las manteve-me ocupado e proporcionou-me uma sensação proveitosa da
passagem do tempo. Mesmo assim, contudo, a expectativa apreensiva da vigília
tornou-se-me pesada. Foi após a meia-noite que a vela da alcova subitamente
apagou, e a sombra negra retornou ao seu lugar. Não vi a vela apagar-se;
simplesmente virei-me e vi que a escuridão estava lá, como alguém que se
surpreendesse ao ver a presença inesperada de um estranho. “Por Júpiter!”,
disse eu em voz alta, “aquela corrente de ar é forte!”; e pegando os fósforos
da mesa, atravessei o quarto de modo despreocupado para iluminar novamente o
canto. Não consegui acender o primeiro fósforo e quando consegui acender o
segundo algo pareceu piscar na parede a minha frente. Virei a cabeça
involuntariamente e vi que as duas velas sobre a mesinha ao lado da lareira
haviam se apagado. Pus-me imediatamente em pé.
“Estranho!”,
disse. “Eu mesmo fiz isso, sem me dar conta?”
Voltei,
reacendi uma e quando o fiz vi a vela na arandela à direita de um dos espelhos
tremular e apagar-se totalmente; quase imediatamente sua companheira seguiu-a.
Não havia dúvidas quanto a isso. A chama sumiu, como se os pavios tivessem sido
subitamente beliscados entre um dedo e um polegar, deixando o pavio, não em
brasa ou fumegante, mas preto. Enquanto eu estava paralisado, ofegante, a vela
ao pé da cama apagou, e as sombras pareceram dar um outro passo em minha
direção.
“Assim
não vai dar!”, disse eu, e uma e depois outra vela sobre o aparador se
seguiram. “O que está acontecendo?”, exclamei, com uma voz que alcançava um tom
agudo e estranho. Nesse instante a vela sobre o guarda-roupa apagou e a que eu
reacendera na alcova seguiu-a.
“Fique
firme!”, disse eu. “Essas velas são necessárias”, expressando-me num tom de
facécia semi-histérica, e riscando um fósforo sem parar para os castiçais da
cornija da lareira. Minhas mãos tremiam tanto que por duas vezes errei a
superfície rugosa da caixa de fósforos. Quando a cornija emergiu novamente das
trevas, duas velas no canto mais distante da janela estavam apagadas. Mas com o
mesmo fósforo reacendi as velas maiores do espelho e as do chão próximas da porta,
e com isso, por algum tempo, pareceu que eu vencera os apagamentos. Mas então,
em uma saraivada, apagaram-se quatro luzes ao mesmo tempo em diferentes cantos
do quarto, e acendi outro fósforo, trêmulo na pressa, e parei hesitante, sem
saber para onde levá-lo.
Enquanto
estava ali indeciso, uma mão invisível pareceu golpear as duas velas sobre a
mesa. Com um grito de terror disparei para a alcova, depois para o canto e em
seguida para a janela, reacendendo três, enquanto duas outras se extinguiam ao
lado da lareira; então, divisando um meio melhor, larguei os fósforos sobre a
escrivaninha no canto e agarrei o candelabro do quarto. Com isso, evitei a
demora em riscar os fósforos; mas mesmo assim o curso uniforme de apagamento
continuou, e as sombras que eu temia e contra as quais lutava retornaram e se
arrastaram até mim, primeiro com um passo deste lado e depois daquele. Era como
uma nuvem de tempestade esgarçada apagando as estrelas. De quando em quando,
uma retornava por um instante e depois era perdida novamente. A essa altura eu
já estava quase desvairado de pavor das trevas a caminho, e meu autocontrole
abandonou-me. Pulei ofegante e acorri de vela em vela, em um esforço inútil
contra o avanço implacável. Machuquei minha coxa contra a mesa, virei uma cadeira,
tropecei, caí e na queda puxei a toalha da mesa. Minha vela rolou para longe de
mim, e agarrei uma outra quando levantei. Esta foi abruptamente, enquanto eu a
tirava apressadamente da mesa, apagada pelo deslocamento de ar provocado pelo
meu movimento súbito, e imediatamente as duas velas restantes a acompanharam.
Mas ainda havia luz na sala, uma luz vermelha que afastava de mim as sombras. O
fogo! É claro que eu ainda podia aproximar minha vela das toras e reacendê-la!
Fui
até onde as chamas ainda dançavam entre os pedaços de carvão re-luzentes e
difundiam reflexos rubros sobre a mobília, dei dois passos em direção à grelha
e nesse exato instante as chamas bruxulearam e se apagaram, e, enquanto eu
enfiava a vela entre as toras, a escuridão fechou-se sobre mim como o baixar de
pálpebras, envolvendo-me num abraço apertado, selando minha visão e esmagando
os últimos vestígios de razão no meu cérebro. A vela caiu-me da mão. Estiquei
os braços em um vão esforço para arremessar para longe de mim aquela escuridão
poderosa e, levantando a voz, gritei com toda força — uma, duas, três vezes.
Depois, acho que devo ter me levantado, cambaleando. Lembro-me de ter pensado
subitamente no corredor iluminado da luz do luar e, com a cabeça pendida e os
braços sobre o rosto, consegui correr para a porta.
Mas
eu esquecera a posição exata da porta, e bati com força contra o canto da cama.
Zonzo, recuei, virei e ou fui golpeado ou dei de encontro com alguma outra peça
volumosa de mobília. Tenho uma vaga lembrança de ter-me debatido assim, para cá
e para lá na escuridão, de uma luta convulsiva e de meu próprio grito
desvairado enquanto corria para cá e para lá, de um golpe forte, finalmente, em
minha testa, uma horrível sensação de cair que durou séculos, de meu último
esforço frenético para manter-me em pé, e de mais nada depois disso.
Abri
os olhos com a luz do dia. Minha cabeça estava toscamente enfaixada, e o homem
do braço mirrado observava meu rosto. Olhei a minha volta, tentando lembrar o
que acontecera, e por um tempo não consegui. Girei os olhos e vi a velha, não
mais absorta, derramando algumas gotas de remédio de um frasco azul para um
copo. “Onde estou?”, perguntei, “acho que me lembro de vocês, mas não consigo
lembrar quem são.”
Eles
me disseram então, e ouvi falar do quarto vermelho mal-assom-brado como quem
ouve um conto de fadas. “Nós o encontramos ao amanhecer”, disse ele, “e havia
sangue na sua testa e em sua boca.”
Apenas
muito lentamente recobrei a memória de minha experiência. “Você acredita
agora”, disse o velho, “que o quarto é mal-assombrado?” Ele não falava mais
como alguém que cumprimenta um intruso, mas como quem lamenta um amigo
alquebrado.
“Sim”,
disse eu, “o quarto é mal-assombrado.”
“E
você mesmo viu. E nós, que moramos aqui durante toda a vida, nunca o vimos.
Porque nunca ousamos... Diga-nos, é mesmo o velho conde que...”
“Não”,
disse eu, “não é.”
“Eu
lhe falei”, disse a velha, com o copo na mão. “É a pobre condessa jovem que
estava com medo...”
“Não
é”, disse eu. "Não existem nem fantasma de conde nem fantasma de condessa
naquele quarto, não existe nenhum fantasma lá; mas é muito pior, muito, muito
pior.”
“E
então?”, disseram.
“A
pior de todas as coisas que assombram o pobre mortal”, disse eu; “e ela é, pura
e simplesmente, o Medo! O medo de que não haja luz nem som, o que não se
harmoniza com a razão, isso ensurdece, deprime e subjuga. Ele seguiu-me pelo
corredor, lutou contra mim no quarto...”
Parei
subitamente. Houve um intervalo de silêncio. Levei a mão às bandagens. Então o
homem da sombra suspirou e falou. “É isso”, disse ele. “Eu sabia que era isso.
Um poder das trevas. Pôr uma maldição dessas sobre uma mulher! Ele está sempre
lá, à espreita. Podemos senti-lo até mesmo durante o dia, até mesmo em um dia
claro de verão, nos reposteiros, nas cortinas, ficando atrás de nós sempre que
não estamos olhando. Na penumbra, ele rasteja pelo corredor e o segue, e nós
não ousamos olhar para trás. Há Medo naquele quarto dela — Medo negro e
haverá... enquanto esta morada do pecado durar.”
01) Nesse
conto, o tom de mistério e de sobrenatural, fundamental para o envolvimento do
leitor na trama narrativa, aparece desde o início. O dialogo entre o narrador e
os dois velhos não pretende:
a) despertar
a iniciativa no leitor de resolver um caso de mistério
b) transmitir
sensações de medo
c) transmitir
sensações de insegurança
d)
aguçar a curiosidade para o que virá a seguir
e) nra
02) Leia
o que diz a velha senhora: “Há muitas coisas para ver
quando ainda se está com vinte e oito anos.”, “Muitas coisas para ver e
lamentar.”. O que ela sugere?
a) Ela sugere que
algo misterioso está para acontecer
b) Ela se refere
aos fenômenos sobrenaturais que aconteceram fora do quarto vermelho
c) Ela pretende
envolver o narrador na historia e ajuda-la a resolver o caso
d) Ela apenas se expõe,
ao desabafar com o narrador sobre assuntos pessoais
e) nra
03) O desafio era
passar a noite no quarto vermelho, que tinha fama de ser mal-assombrado. Dentre
os muitos fatos que deram fama a este quarto, destaca-se:
a) a trágica morte
de uma velha
b) a trágica morte
de um marquês
c) a trágica morte
de um duque após uma frustrada noite de amor
d) a existência de
corvos
e) nra
04) O que o
narrador-personagem queria comprovar ao fazer a vigília no quarto vermelho?
a) Comprovar que não
acreditava em fantasmas
b) Comprovar que
as mortes ocorridas ali tinham sido provocadas por fenômenos sobrenaturais
c) Comprovar que
fantasmas e mortes não acontecem em quartos
d) Ter maior
conhecimento sobre forças além-tumulo
e) nra
05) Antes de
entrar no quarto, o narrador-personagem atravessa um longo corredor, que é
caracterizado por diversos termos, exceto:
a) subterrâneo
b) comprido
c) atravessado de
correntes de ar
d) gelado
e) nra
06) Quando a vela
da alcova se apagou e a sombra negra voltou a aparecer, sinalizou-se dentro do
texto:
a) a elucidação da
trama
b) a complicação do
enredo
c) a revelação
d) a finalização
e) nra
07) Tendo em vista
as regras de concordância nominal, assinale a opção em que a lacuna só pode ser
preenchida por um dos termos colocados entre parênteses:
a) cabelo e pupila __________ (negros / negras);
b) cabeça e corpo __________ (monstruoso / monstruosos);
c) calma e serenidade _______ (invejável
/ invejáveis);
d) dentes e garras __________ (afiados / afiadas);
e) galhos e tronco ___________(seco /
secos).
08) Assinale a opção em que a mudança de
pessoa verbal provoca erro.
a) Requeremos a pavimentação da rua
Vicente de Carvalho. - Requeiro a pavimentação da rua Vicente de Carvalho.
b) Apesar do espaço pequeno, temos
certeza de que cabemos aí. - Apesar do espaço pequeno, tenho certeza de que
caibo aí.
c) Se não nos
precavemos a tempo, seremos ludibriados. - Se não me precavenho a tempo, serei
ludibriado.
d) Graças ao seu auxílio, reaveremos os
documentos. - Graças ao seu auxílio, reaverei os documentos.
e) Nós valemos tanto quanto acreditamos
ser nosso valor. - Eu valho tanto quanto acredito ser meu valor.
09) “...sabe fugir da carrocinha pelas próprias patas”.
Considerando a concordância nominal, o
vocábulo destacado na citação acima será empregado no mesmo gênero e número
para preenchimento da lacuna em:
a) Ele tem atitude e opinião ___________
.
b) Nós possuímos casas e apartamentos ___________
.
c) Ele defendeu ponto de vista e idéia ___________
.
d) Ela e ele ___________ fizeram o
trabalho.
e) Paulo e ela ___________ vieram
receber‑me.
10) Tendo em vista as regras de
concordância, assinale a opção em que a forma entre parênteses NÃO completa
corretamente a lacuna da frase:
a) São bastante _________ tais idéias e
opiniões sobre o computador. (difundidas)
b) Serão _________ tanto os técnicos
quanto as pessoas menos qualificadas. (prejudicados)
c) Tornam‑se muito _________ a área e os
meios de atuação dos funcionários. (limitadas)
d) Podem ser neste
ponto _________a tarefa dos antigos artesãos e a dos modernos operários.
(comparadas)
e) Ficam _________ nas mãos de poucos
todos os conhecimentos e habilidades. (concentrados)
11) “Meninas, avisem a _________ colegas
que vocês _________ é que vão dirigir os ensaios da peça.”
a) vossos – mesmos;
b) seus – mesmas;
c) vossos – mesmas;
d) seus – mesma;
e) vossos – mesmo.
12) Tendo em vista as regras de
concordância, assinale a opção em que a forma entre os parênteses NÃO completa
corretamente a lacuna da frase:
a) Devem ser ____ engenho e habilidades
daqueles que integram uma mesma comunidade. (coordenadas)
b) Os países pobres e os países ricos
possuem recursos e necessidades muito ____ . (diversos)
c) É preciso que Ciência e Tecnologia
estejam ____ às aspirações da comunidade. (subordinadas)
d) Em muitos países, estão intimamente
____ o fenômeno científico e o social. (ligados)
e) Os mecanismos e intenções que
determinam a pesquisa nos países ricos são erroneamente ____ para os países
pobres. (transferidos)
13) Indique a frase em que a palavra só
é invariável:
a) Eles partiram sós, deixando‑me para trás aborrecida e bastante magoada.
b) Chegada sós, com o mesmo ar exuberante de sempre.
c) Sós,
aquelas moças desapareceram, cheias de preocupações.
d) Aqueles jovens rebeldes provocaram sós essa motivação.
e) Depois de tão pesadas ofensas,
prefiro ficar a sós a conviver com
essa agressiva companhia.
14) O caso de concordância nominal inaceitável
aparece em:
a) Nunca houve divergências entre mim e
ti.
b) Ele tinha o corpo e o rosto
arranhados.
c) Recebeu o cravo e a rosa perfumado.
d) Tinha vãs esperanças e temores.
e) É necessário certeza.