Conto de verão nº
2: Bandeira Branca
Ele: tirolês. Ela:
odalisca; Eram de culturas muito diferentes, não podia dar certo. Mas tinham só
quatro anos e se entenderam. No mundo dos quatro anos todos se entendem, de um
jeito ou de outro. Em vez de dançarem, pularem e entrarem no cordão, resistiram
a todos os apelos desesperados das mães e ficaram sentados no chão, fazendo um
montinho de confete, serpentina e poeira, até serem arrastados para casa, sob
ameaças de jamais serem levados a outro baile de Carnaval.
Encontraram-se de novo no baile infantil do clube, no ano seguinte. Ele com o mesmo tirolês, agora apertado nos fundilhos, ela de egípcia. Tentaram recomeçar o montinho, mas dessa vez as mães reagiram e os dois foram obrigados a dançar, pular e entrar no cordão, sob ameaça de levarem uns tapas. Passaram o tempo todo de mãos dadas. Só no terceiro Carnaval se falaram.- Como é teu nome?
- Janice. E o teu?
- Píndaro.
- O quê?!
- Píndaro.
- Que nome!
Encontraram-se de novo no baile infantil do clube, no ano seguinte. Ele com o mesmo tirolês, agora apertado nos fundilhos, ela de egípcia. Tentaram recomeçar o montinho, mas dessa vez as mães reagiram e os dois foram obrigados a dançar, pular e entrar no cordão, sob ameaça de levarem uns tapas. Passaram o tempo todo de mãos dadas. Só no terceiro Carnaval se falaram.- Como é teu nome?
- Janice. E o teu?
- Píndaro.
- O quê?!
- Píndaro.
- Que nome!
Ele de legionário
romano, ela de índia americana.
Só no sétimo baile
(pirata, chinesa) desvendaram o mistério de só se encontrarem no Carnaval e
nunca se encontrarem no clube, no resto do ano. Ela morava no interior, vinha
visitar uma tia no Carnaval, a tia é que era sócia.
- Ah.
Foi o ano em que
ele preferiu ficar com a sua turma tentando encher a boca das meninas de
confete, e ela ficou na mesa, brigando com a mãe, se recusando a brincar, o
queixo enterrado na gola alta do vestido de imperadora. Mas quase no fim do
baile, na hora do Bandeira Branca, ele veio e a puxou pelo braço, e os dois
foram para o meio do salão, abraçados. E, quando se despediram, ela o beijou na
face, disse -Até o Carnaval que vem- e saiu correndo.
No baile do ano em
que fizeram 13 anos, pela primeira vez as fantasias dos dois combinaram.
Toureiro e bailarina espanhola. Formavam um casal! Beijaram-se muito, quando as
mães não estavam olhando. Até na boca. Na hora da despedida, ele pediu:
- Me dá alguma
coisa.
- O quê?
- Qualquer coisa.
- O leque. O leque da bailarina.
Ela diria para a mãe que o tinha perdido no salão.
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- O quê?
- Qualquer coisa.
- O leque. O leque da bailarina.
Ela diria para a mãe que o tinha perdido no salão.
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No ano seguinte,
ela não apareceu no baile. Ele ficou o tempo todo à procura, um havaiano
desconsolado. Não sabia nem como perguntar por ela. Não conhecia a tal tia.
Passara um ano inteiro pensando nela, às vezes tirando o leque do seu
esconderijo para cheirá-lo, antegozando o momento de encontrá-la outra vez no
baile. E ela não apareceu. Marcelão, o mau elemento da sua turma, tinha levado
gim para misturar com o guaraná. Ele bebeu demais. Teve que ser carregado para
casa. Acordou na sua cama sem lençol, que estava sendo lavado. O que
acontecera?
- Você vomitou a
alma – disse a mãe.
Era exatamente
como se sentia. Como alguém que vomitara a alma e nunca a teria de volta.
Nunca. Nem o leque tinha mais o cheiro dela.
Mas, no ano
seguinte, ele foi ao baile dos adultos no clube – e lá estava ela! Quinze anos.
Uma moça. Peitos, tudo. Uma fantasia indefinida.
- Sei lá. Bávara
tropical – disse ela, rindo.
Estava diferente.
Não era só o corpo. Menos tímida, o riso mais alto. Contou que faltara no ano
anterior porque a avó morrera, logo no Carnaval.
- E aquela
bailarina espanhola? – Nem me fala. E o toureiro? – Aposentado.
A fantasia dele
era de nada. Camisa florida, bermuda, finalmente um brasileiro. Ela estava com
um grupo. Primos, amigos dos primos. Todos vagamente bávaros. Quando ela o
apresentou ao grupo, alguém disse -Píndaro?!- e todos caíram na risada. Ele viu
que ela estava rindo também. Deu uma desculpa e afastou-se. Foi procurar o
Marcelão. O Marcelão anunciara que levaria várias garrafas presas nas pernas,
escondidas sob as calças da fantasia de sultão. O Marcelão tinha o que ele
precisava para encher o buraco deixado pela alma. Quinze anos, pensou ele, e já
estou perdendo todas as ilusões da vida, começando pelo Carnaval. Não devo
chegar aos 30, pelo menos não inteiro. Passou todo o baile encostado numa
coluna adornada, bebendo o guaraná clandestino do Marcelão, vendo ela passar
abraçada com uma sucessão de primos e amigos de primos, principalmente um
halterofilista, certamente burro, talvez até criminoso, que reduzira sua
fantasia a um par de calças curtas de couro. Pensou em dizer alguma coisa, mas
só o que lhe ocorreu dizer foi -pelo menos o meu tirolês era autêntico- e
desistiu. Mas, quando a banda começou a tocar Bandeira Branca e ele se dirigiu
para a saída, tonto e amargurado, sentiu que alguém o pegava pela mão, virou-se
e era ela. Era ela, meu Deus, puxando-o para o salão. Ela enlaçando-o com os
dois braços para dançarem assim, ela dizendo -não vale, você cresceu mais do
que eu- e encostando a cabeça no seu ombro. Ela encostando a cabeça no seu
ombro.
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Encontraram-se de
novo 15 anos depois. Aliás, neste Carnaval. Por acaso, num aeroporto. Ela
desembarcando, a caminho do interior, para visitar a mãe. Ele embarcando para
encontrar os filhos no Rio. Ela disse -quase não reconheci você sem fantasias-.
Ele custou a reconhecê-la. Ela estava gorda, nunca a reconheceria, muito menos
de bailarina espanhola. A última coisa que ele lhe dissera fora -preciso te
dizer uma coisa-, e ela dissera -no Carnaval que vem, no Carnaval que vem- e no
Carnaval seguinte ela não aparecera, ela nunca mais aparecera. Explicou que o
pai tinha sido transferido para outro estado, sabe como é, Banco do Brasil, e
como ela não tinha o endereço dele, como não sabia nem o sobrenome dele e,
mesmo, não teria onde tomar nota na fantasia de falsa bávara-
- O que você ia me
dizer, no outro Carnaval? – perguntou ela. – Esqueci – mentiu ele.
Trocaram
informações. Os dois casaram, mas ele já se separou. Os filhos dele moram no
Rio, com a mãe. Ela, o marido e a filha moram em Curitiba, o marido também é do
Banco do Brasil- E a todas essas ele pensando: digo ou não digo que aquele foi
o momento mais feliz da minha vida, Bandeira Branca, a cabeça dela no meu
ombro, e que todo o resto da minha vida será apenas o resto da minha vida? E
ela pensando: como é mesmo o nome dele? Péricles. Será Péricles? Ele: digo ou
não digo que não cheguei mesmo inteiro aos 30, e que ainda tenho o leque? Ela:
Petrarco. Pôncio. Ptolomeu.
01) O conto narra
uma historia de amor que começa quando os personagens ainda eram crianças. Como
exatamente ela começa e o que acontece a partir deste fato?
a) Duas crianças se
conhecem durante o carnaval e a partir dai se amam mutuamente pelo resto de
suas vidas.
b) Duas crianças se
encontram em um baile de carnaval; daí em diante, passam a se encontrar quase
todos os dias
c) Duas crianças se
encontram em um baile de carnaval; daí em diante, passam a se encontrar quase
todos os anos
d) Duas crianças se
conhecem durante o carnaval e a partir dai se amam mutuamente pelo resto de
suas vidas, todos os dias.
e) nra
02) Por quantos
anos eles se encontram?
a) 8
b) 9
c) 10
d) 11
e) nra
03) Pode-se dizer
que :
a) o narrador é
personagem da historia
b) o narrador é um
observador da historia
c) o narrador não participa
da historia, verificado pela ausência do pronome EU
d) o narrador não participa
da historia; os verbos estão na terceira pessoa.
e) nra
04) Em “...às
vezes tirando o leque do seu esconderijo para cheirá-lo,...” são adjuntos
adnominais de ESCONDERIJO:
a) às, leque
b) tirando, seu
c) do, para
d) do, seu
e) cheirá-lo,
leque
05) Não vemos
adjuntos adverbiais de modo na alternativa:
a) A fantasia dele
era de nada. Camisa florida, bermuda, finalmente um brasileiro.
b) Todos vagamente
bávaros.
c) ... vendo ela
passar abraçada com uma sucessão de primos e amigos de primos, principalmente
um halterofilista,...
d) Era exatamente
como se sentia.
e) nra
05) Há aposto na
alternativa:
a) Mas, quando a
banda começou a tocar Bandeira Branca e ele se dirigiu para a saída, tonto e
amargurado, sentiu que alguém o pegava pela mão,...
b) Era ela, meu
Deus, puxando-o para o salão.
c) Ela encostando
a cabeça no seu ombro.
d) Aliás, neste Carnaval. Por acaso, num aeroporto.
d) Aliás, neste Carnaval. Por acaso, num aeroporto.
e) Ela
desembarcando, a caminho do interior, para visitar a mãe.
06) O autor
finaliza sua historia apresentando dados do casal. Pode-se dizer que:
a) eles foram
felizes para sempre, juntos.
b) eles seguiram
suas vidas, mas separados um do outro.
c) eles foram bem
sucedidos profissionalmente como bancários.
d) nada ficou
desta época em suas memorias
e) nra