Primeiramente, quero que leiam as REGRAS DE TAREFA:
(http://cursopreparatorioparacefetmt.blogspot.com/2022/01/regras-de-tarefa-do-curso-para-novos.html) para realizarem-na de
forma correta e não deixar que sejam desclassificadas.
A Cartomante
de Machado de Assis
Hamlet observa a
Horácio que há mais cousas no céu e na terra do que sonha a nossa filosofia.
Era a mesma explicação que dava a bela Rita ao moço Camilo, numa sexta-feira de
novembro de 1869, quando este ria dela, por ter ido na véspera consultar uma
cartomante; a diferença é que o fazia por outras palavras. — Ria, ria. Os
homens são assim; não acreditam em nada. Pois saiba que fui, e que ela
adivinhou o motivo da consulta, antes mesmo que eu lhe dissesse o que era.
Apenas começou a botar as cartas, disse-me: "A senhora gosta de uma
pessoa..." Confessei que sim, e então ela continuou a botar as cartas,
combinou-as, e no fim declarou-me que eu tinha medo de que você me esquecesse,
mas que não era verdade... — Errou! interrompeu Camilo, rindo. — Não diga isso,
Camilo. Se você soubesse como eu tenho andado, por sua causa. Você sabe; já lhe
disse. Não ria de mim, não ria... Camilo pegou-lhe nas mãos, e olhou para ela
sério e fixo. Jurou que lhe queria muito, que os seus sustos pareciam de
criança; em todo o caso, quando tivesse algum receio, a melhor cartomante era
ele mesmo. Depois, repreendeu-a; disse-lhe que era imprudente andar por essas
casas. Vilela podia sabê-lo, e depois... — Qual saber! tive muita cautela, ao
entrar na casa. — Onde é a casa? — Aqui perto, na Rua da Guarda Velha; não
passava ninguém nessa ocasião. Descansa; eu não sou maluca. Camilo riu outra
vez: — Tu crês deveras nessas cousas? perguntou-lhe. Foi então que ela, sem
saber que traduzia Hamlet em vulgar, disse-lhe que havia muita cousa misteriosa
e verdadeira neste mundo. Se ele não acreditava, paciência; mas o certo é que a
cartomante adivinhara tudo. Que mais? A prova é que ela agora estava tranqüila
e satisfeita. Cuido que ele ia falar, mas reprimiu-se. Não queria arrancar-lhe
as ilusões. Também ele, em criança, e ainda depois, foi supersticioso, teve um
arsenal inteiro de crendices, que a mãe lhe incutiu e que aos vinte anos
desapareceram. No dia em que deixou cair toda essa vegetação parasita, e ficou
só o tronco da religião, ele, como tivesse recebido da mãe ambos os ensinos,
envolveu-os na mesma dúvida, e logo depois em uma só negação total. Camilo não
acreditava em nada. Por quê? Não poderia dizê-lo, não possuía um só argumento:
limitava-se a negar tudo. E digo mal, porque negar é ainda afirmar, e ele não
formulava a incredulidade; diante do mistério, contentou-se em levantar os
ombros, e foi andando. Separaram-se contentes, ele ainda mais que ela. Rita
estava certa de ser amada; Camilo, não só o estava, mas via-a estremecer e
arriscar-se por ele, correr às cartomantes, e, por mais que a repreendesse, não
podia deixar de sentir-se lisonjeado. A casa do encontro era na antiga Rua dos
Barbonos, onde morava uma comprovinciana de Rita. Esta desceu pela Rua das
Mangueiras, na direção de Botafogo, onde residia; Camilo desceu pela da Guarda
Velha, olhando de passagem para a casa da cartomante.
Vilela, Camilo e
Rita, três nomes, uma aventura e nenhuma explicação das origens. Vamos a ela.
Os dois primeiros eram amigos de infância. Vilela seguiu a carreira de
magistrado. Camilo entrou no funcionalismo, contra a vontade do pai, que queria
vê-lo médico; mas o pai morreu, e Camilo preferiu não ser nada, até que a mãe
lhe arranjou um emprego público. No princípio de 1869, voltou Vilela da
província, onde casara com uma dama formosa e tonta; abandonou a magistratura e
veio abrir banca de advogado. Camilo arranjou-lhe casa para os lados de
Botafogo, e foi a bordo recebê-lo.
— É o senhor?
exclamou Rita, estendendo-lhe a mão. Não imagina como meu marido é seu amigo,
falava sempre do senhor.
Camilo e Vilela
olharam-se com ternura. Eram amigos deveras. Depois, Camilo confessou de si
para si que a mulher do Vilela não desmentia as cartas do marido. Realmente,
era graciosa e viva nos gestos, olhos cálidos, boca fina e interrogativa. Era
um pouco mais velha que ambos: contava trinta anos, Vilela vinte e nove e
Camilo vinte e seis. Entretanto, o porte grave de Vilela fazia-o parecer mais
velho que a mulher, enquanto Camilo era um ingênuo na vida moral e prática. Faltava-lhe
tanto a ação do tempo, como os óculos de cristal, que a natureza põe no berço
de alguns para adiantar os anos. Nem experiência, nem intuição.
Uniram-se os três.
Convivência trouxe intimidade. Pouco depois morreu a mãe de Camilo, e nesse
desastre, que o foi, os dois mostraram-se grandes amigos dele. Vilela cuidou do
enterro, dos sufrágios e do inventário; Rita tratou especialmente do coração, e
ninguém o faria melhor.
Como daí chegaram ao
amor, não o soube ele nunca. A verdade é que gostava de passar as horas ao lado
dela, era a sua enfermeira moral, quase uma irmã, mas principalmente era mulher
e bonita. Odor di feminina: eis o que ele aspirava nela, e em volta dela, para
incorporá-lo em si próprio. Liam os mesmos livros, iam juntos a teatros e passeios.
Camilo ensinou-lhe as damas e o xadrez e jogavam às noites; — ela mal, — ele,
para lhe ser agradável, pouco menos mal. Até aí as cousas. Agora a ação da
pessoa, os olhos teimosos de Rita, que procuravam muita vez os dele, que os
consultavam antes de o fazer ao marido, as mãos frias, as atitudes insólitas.
Um dia, fazendo ele anos, recebeu de Vilela uma rica bengala de presente e de
Rita apenas um cartão com um vulgar cumprimento a lápis, e foi então que ele
pôde ler no próprio coração, não conseguia arrancar os olhos do bilhetinho.
Palavras vulgares; mas há vulgaridades sublimes, ou, pelo menos, deleitosas. A
velha caleça de praça, em que pela primeira vez passeaste com a mulher amada,
fechadinhos ambos, vale o carro de Apolo. Assim é o homem, assim são as cousas
que o cercam.
Camilo quis
sinceramente fugir, mas já não pôde. Rita, como uma serpente, foi-se acercando
dele, envolveu-o todo, fez-lhe estalar os ossos num espasmo, e pingou-lhe o
veneno na boca. Ele ficou atordoado e subjugado. Vexame, sustos, remorsos,
desejos, tudo sentiu de mistura, mas a batalha foi curta e a vitória delirante.
Adeus, escrúpulos! Não tardou que o sapato se acomodasse ao pé, e aí foram
ambos, estrada fora, braços dados, pisando folgadamente por cima de ervas e
pedregulhos, sem padecer nada mais que algumas saudades, quando estavam
ausentes um do outro. A confiança e estima de Vilela continuavam a ser as
mesmas.
Um dia, porém, recebeu Camilo uma carta
anônima, que lhe chamava imoral e pérfido, e dizia que a aventura era sabida de
todos. Camilo teve medo, e, para desviar as suspeitas, começou a rarear as
visitas à casa de Vilela. Este notou-lhe as ausências. Camilo respondeu que o
motivo era uma paixão frívola de rapaz. Candura gerou astúcia. As ausências
prolongaram-se, e as visitas cessaram inteiramente. Pode ser que entrasse
também nisso um pouco de amor-próprio, uma intenção de diminuir os obséquios do
marido, para tornar menos dura a aleivosia do ato.
Foi por esse tempo
que Rita, desconfiada e medrosa, correu à cartomante para consultá-la sobre a
verdadeira causa do procedimento de Camilo. Vimos que a cartomante
restituiu-lhe a confiança, e que o rapaz repreendeu-a por ter feito o que fez.
Correram ainda algumas semanas. Camilo recebeu mais duas ou três cartas
anônimas, tão apaixonadas, que não podiam ser advertência da virtude, mas
despeito de algum pretendente; tal foi a opinião de Rita, que, por outras
palavras mal compostas, formulou este pensamento: — a virtude é preguiçosa e
avara, não gasta tempo nem papel; só o interesse é ativo e pródigo.
Nem por isso Camilo
ficou mais sossegado; temia que o anônimo fosse ter com Vilela, e a catástrofe
viria então sem remédio. Rita concordou que era possível.
— Bem, disse ela; eu
levo os sobrescritos para comparar a letra com as das cartas que lá aparecerem;
se alguma for igual, guardo-a e rasgo-a...
Nenhuma apareceu; mas daí a algum tempo
Vilela começou a mostrar-se sombrio, falando pouco, como desconfiado. Rita
deu-se pressa em dizê-lo ao outro, e sobre isso deliberaram. A opinião dela é
que Camilo devia tornar à casa deles, tatear o marido, e pode ser até que lhe
ouvisse a confidência de algum negócio particular. Camilo divergia; aparecer
depois de tantos meses era confirmar a suspeita ou denúncia. Mais valia
acautelarem-se, sacrificando-se por algumas semanas. Combinaram os meios de se
corresponderem , em caso de necessidade, e separaram-se com lágrimas.
No dia seguinte,
estando na repartição, recebeu Camilo este bilhete de Vilela: "Vem já, já,
à nossa casa; preciso falar-te sem demora." Era mais de meio-dia. Camilo
saiu logo; na rua, advertiu que teria sido mais natural chamá-lo ao escritório;
por que em casa? Tudo indicava matéria especial, e a letra, fosse realidade ou
ilusão, afigurou-se-lhe trêmula. Ele combinou todas essas cousas com a notícia
da véspera.
— Vem já, já, à nossa
casa; preciso falar-te sem demora, — repetia ele com os olhos no papel.
Imaginariamente, viu
a ponta da orelha de um drama, Rita subjugada e lacrimosa, Vilela indignado,
pegando da pena e escrevendo o bilhete, certo de que ele acudiria, e
esperando-o para matá-lo. Camilo estremeceu, tinha medo: depois sorriu amarelo,
e em todo caso repugnava-lhe a idéia de recuar, e foi andando. De caminho,
lembrou-se de ir a casa; podia achar algum recado de Rita, que lhe explicasse
tudo. Não achou nada, nem ninguém. Voltou à rua, e a idéia de estarem
descobertos parecia-lhe cada vez mais verossímil; era natural uma denúncia
anônima, até da própria pessoa que o ameaçara antes; podia ser que Vilela
conhecesse agora tudo. A mesma suspensão das suas visitas, sem motivo aparente,
apenas com um pretexto fútil, viria confirmar o resto.
Camilo ia andando
inquieto e nervoso. Não relia o bilhete, mas as palavras estavam decoradas,
diante dos olhos, fixas, ou então, — o que era ainda pior, — eram-lhe
murmuradas ao ouvido, com a própria voz de Vilela. "Vem já, já, à nossa
casa; preciso falar-te sem demora." Ditas assim, pela voz do outro, tinham
um tom de mistério e ameaça. Vem, já, já, para quê? Era perto de uma hora da
tarde. A comoção crescia de minuto a minuto. Tanto imaginou o que se iria
passar, que chegou a crê-lo e vê-lo. Positivamente, tinha medo. Entrou a
cogitar em ir armado, considerando que, se nada houvesse, nada perdia, e a
precaução era útil. Logo depois rejeitava a idéia, vexado de si mesmo, e
seguia, picando o passo, na direção do Largo da Carioca, para entrar num
tílburi. Chegou, entrou e mandou seguir a trote largo.
"Quanto antes,
melhor, pensou ele; não posso estar assim..."
Mas o mesmo trote do
cavalo veio agravar-lhe a comoção. O tempo voava, e ele não tardaria a entestar
com o perigo. Quase no fim da Rua da Guarda Velha, o tílburi teve de parar, a
rua estava atravancada com uma carroça, que caíra. Camilo, em si mesmo, estimou
o obstáculo, e esperou. No fim de cinco minutos, reparou que ao lado, à
esquerda, ao pé do tílburi, ficava a casa da cartomante, a quem Rita consultara
uma vez, e nunca ele desejou tanto crer na lição das cartas. Olhou, viu as
janelas fechadas, quando todas as outras estavam abertas e pejadas de curiosos
do incidente da rua. Dir-se-ia a morada do indiferente Destino.
Camilo reclinou-se no
tílburi, para não ver nada. A agitação dele era grande, extraordinária, e do
fundo das camadas morais emergiam alguns fantasmas de outro tempo, as velhas
crenças, as superstições antigas. O cocheiro propôs-lhe voltar à primeira
travessa, e ir por outro caminho: ele respondeu que não, que esperasse. E
inclinava-se para fitar a casa... Depois fez um gesto incrédulo: era a idéia de
ouvir a cartomante, que lhe passava ao longe, muito longe, com vastas asas
cinzentas; desapareceu, reapareceu, e tornou a esvair-se no cérebro; mas daí a
pouco moveu outra vez as asas, mais perto, fazendo uns giros concêntricos... Na
rua, gritavam os homens, safando a carroça:
— Anda! agora!
empurra! vá! vá!
Daí a pouco estaria
removido o obstáculo. Camilo fechava os olhos, pensava em outras cousas: mas a
voz do marido sussurrava-lhe a orelhas as palavras da carta: "Vem, já,
já..." E ele via as contorções do drama e tremia. A casa olhava para ele.
As pernas queriam descer e entrar . Camilo achou-se diante de um longo véu
opaco... pensou rapidamente no inexplicável de tantas cousas. A voz da mãe
repetia-lhe uma porção de casos extraordinários: e a mesma frase do príncipe de
Dinamarca reboava-lhe dentro: "Há mais cousas no céu e na terra do que
sonha a filosofia... " Que perdia ele, se... ?
Deu por si na
calçada, ao pé da porta: disse ao cocheiro que esperasse, e rápido enfiou pelo
corredor, e subiu a escada. A luz era pouca, os degraus comidos dos pés, o
corrimão pegajoso; mas ele não, viu nem sentiu nada. Trepou e bateu. Não
aparecendo ninguém, teve idéia de descer; mas era tarde, a curiosidade
fustigava-lhe o sangue, as fontes latejavam-lhe; ele tornou a bater uma, duas,
três pancadas. Veio uma mulher; era a cartomante. Camilo disse que ia
consultá-la, ela fê-lo entrar. Dali subiram ao sótão, por uma escada ainda pior
que a primeira e mais escura. Em cima, havia uma salinha, mal alumiada por uma
janela, que dava para o telhado dos fundos. Velhos trastes, paredes sombrias,
um ar de pobreza, que antes aumentava do que destruía o prestígio.
A cartomante fê-lo
sentar diante da mesa, e sentou-se do lado oposto, com as costas para a janela,
de maneira que a pouca luz de fora batia em cheio no rosto de Camilo. Abriu uma
gaveta e tirou um baralho de cartas compridas e enxovalhadas. Enquanto as
baralhava, rapidamente, olhava para ele, não de rosto, mas por baixo dos olhos.
Era uma mulher de quarenta anos, italiana, morena e magra, com grandes olhos
sonsos e agudos. Voltou três cartas sobre a mesa, e disse-lhe:
— Vejamos primeiro o
que é que o traz aqui. O senhor tem um grande susto... Camilo, maravilhado, fez
um gesto afirmativo.
— E quer saber,
continuou ela, se lhe acontecerá alguma cousa ou não...
— A mim e a ela,
explicou vivamente ele.
A cartomante não
sorriu: disse-lhe só que esperasse. Rápido pegou outra vez das cartas e
baralhou-as, com os longos dedos finos, de unhas descuradas; baralhou-as bem,
transpôs os maços, uma, duas. três vezes; depois começou a estendê-las. Camilo
tinha os olhos nela. curioso e ansioso.
— As cartas
dizem-me...
Camilo inclinou-se
para beber uma a uma as palavras. Então ela declarou-lhe que não tivesse medo
de nada. Nada aconteceria nem a um nem a outro; ele, o terceiro, ignorava tudo.
Não obstante, era indispensável muita cautela: ferviam invejas e despeitos.
Falou-lhe do amor que os ligava, da beleza de Rita... Camilo estava
deslumbrado. A cartomante acabou, recolheu as cartas e fechou-as na gaveta.
— A senhora
restituiu-me a paz ao espírito, disse ele estendendo a mão por cima da mesa e
apertando a da cartomante.
Esta levantou-se,
rindo.
— Vá, disse ela; vá,
ragazzo innamorato...
E de pé, com o dedo
indicador, tocou-lhe na testa. Camilo estremeceu, como se fosse a mão da
própria sibila, e levantou-se também. A cartomante foi à cômoda, sobre a qual
estava um prato com passas, tirou um cacho destas, começou a despencá-las e comê-las,
mostrando duas fileiras de dentes que desmentiam as unhas. Nessa mesma ação
comum, a mulher tinha um ar particular. Camilo, ansioso por sair, não sabia
como pagasse; ignorava o preço.
— Passas custam
dinheiro, disse ele afinal, tirando a carteira. Quantas quer mandar buscar?
— Pergunte ao seu
coração, respondeu ela.
Camilo tirou uma nota
de dez mil-réis, e deu-lha. Os olhos da cartomante fuzilaram. O preço usual era
dois mil-réis.
— Vejo bem que o
senhor gosta muito dela... E faz bem; ela gosta muito do senhor. Vá, vá,
tranqüilo. Olhe a escada, é escura; ponha o chapéu...
A cartomante tinha já
guardado a nota na algibeira, e descia com ele, falando, com um leve sotaque.
Camilo despediu-se dela embaixo, e desceu a escada que levava à rua, enquanto a
cartomante, alegre com a paga, tornava acima, cantarolando uma barcarola.
Camilo achou o tílburi esperando; a rua estava livre. Entrou e seguiu a trote
largo.
Tudo lhe parecia
agora melhor, as outras cousas traziam outro aspecto, o céu estava límpido e as
caras joviais. Chegou a rir dos seus receios, que chamou pueris; recordou os
termos da carta de Vilela e reconheceu que eram íntimos e familiares. Onde é
que ele lhe descobrira a ameaça? Advertiu também que eram urgentes, e que
fizera mal em demorar-se tanto; podia ser algum negócio grave e gravíssimo.
— Vamos, vamos
depressa, repetia ele ao cocheiro.
E consigo, para
explicar a demora ao amigo, engenhou qualquer cousa; parece que formou também o
plano de aproveitar o incidente para tornar à antiga assiduidade... De volta
com os planos, reboavam-lhe na alma as palavras da cartomante. Em verdade, ela
adivinhara o objeto da consulta, o estado dele, a existência de um terceiro;
por que não adivinharia o resto? O presente que se ignora vale o futuro. Era
assim, lentas e contínuas, que as velhas crenças do rapaz iam tornando ao de
cima, e o mistério empolgava-o com as unhas de ferro. Às vezes queria rir, e
ria de si mesmo, algo vexado; mas a mulher, as cartas, as palavras secas e
afirmativas, a exortação: — Vá, vá, ragazzo innamorato; e no fim, ao longe, a
barcarola da despedida, lenta e graciosa, tais eram os elementos recentes, que
formavam, com os antigos, uma fé nova e vivaz.
A verdade é que o
coração ia alegre e impaciente, pensando nas horas felizes de outrora e nas que
haviam de vir. Ao passar pela Glória, Camilo olhou para o mar, estendeu os
olhos para fora, até onde a água e o céu dão um abraço infinito, e teve assim
uma sensação do futuro, longo, longo, interminável.
Daí a pouco chegou à
casa de Vilela. Apeou-se, empurrou a porta de ferro do jardim e entrou. A casa
estava silenciosa. Subiu os seis degraus de pedra, e mal teve tempo de bater, a
porta abriu-se, e apareceu-lhe Vilela.
— Desculpa, não pude
vir mais cedo; que há?
Vilela não lhe
respondeu; tinha as feições decompostas; fez-lhe sinal, e foram para uma saleta
interior. Entrando, Camilo não pôde sufocar um grito de terror: — ao fundo
sobre o canapé, estava Rita morta e ensangüentada. Vilela pegou-o pela gola, e,
com dois tiros de revólver, estirou-o morto no chão.
01) Ainda sobre o conto, não podemos
afirmar que:
a) A história se passa na Cidade do Rio
de Janeiro;
b) 1A época do conto é 1869, segunda
metade do século XIX;
c) São citados dois bairros cariocas
Glória e Botafogo;
d) No texto há uma frase dita por
Hamlet, personagem criado por Shakespeare;
e) “Há mais coisas no céu e na terra do
que sonha a nossa filosofia” é uma frase proferida pela cartomante.
02) Logo no início do segundo parágrafo
Rita crítica Camilo e o comportamento masculino em geral. Que critica ela faz?
a) Que os homens não são fiéis
b) Que os homens não são honestos
c) Que os homens não acreditam em nada
d) Que os homens são inferiores às
mulheres
e) Que os homens são superiores às
mulheres
03) Quando uma pessoa não acredita em
nada diz-se que ela é cética. O ceticismo está bastante presente
nos textos machadianos. Neste conto, de que maneira aparece esse ceticismo?
a) No conto as cartomantes são
totalmente desacreditadas
b) A fidelidade não é algo creditado ao
ser humano
c) Fidelidade e amor não anda de mãos
juntas
d) As previsões de uma cartomante não
são tão confiáveis quanto a relação de um casal
e) nra
04) Aponte a alternativa correta de
acordo com o texto
a) Rita e Camilo começaram a ter algum
envolvimento afetivo por ocasião da morte da mãe de Camilo
b) Segundo narrador o responsável pela
continuidade do envolvimento dos dois era Camilo
c) O autor utiliza de uma comparação
para se referir ao comportamento de Rita: compara há uma serpente que estala os
ossos de Camilo e pingali sangue na boca
d) A carta recebida por Rita
desencadeia uma mudança no comportamento da cartomante
e) Ao receber o bilhete de Vilela
pedindo para ir à casa dele com urgência Camilo ficou muito nervoso mas não
previu todo o drama
06) Em qual das alternativas abaixo,
temos, claramente, a presença de Aposto?
a) Um dia, fazendo ele anos, recebeu de
Vilela uma rica bengala de presente e de Rita apenas um cartão com um vulgar
cumprimento a lápis,...
b) Assim é o homem, assim são as cousas
que o cercam.
c) Camilo quis sinceramente fugir, mas
já não pôde.
d) Camilo teve medo, e, para desviar as
suspeitas, começou a rarear as visitas à casa de Vilela.
e) Este notou-lhe as ausências.
07) Aponte a alternativa onde os termos
entre parênteses são Adjuntos Adnominais:
a) Jurou que lhe queria muito, que os
seus sustos pareciam de criança; (os; seus; de criança)
b) Foi então que ela, sem saber que
traduzia Hamlet em vulgar, disse-lhe que havia muita cousa misteriosa e
verdadeira neste mundo. (cousa; misteriosa; verdadeira)
c) Se ele não acreditava, paciência;
mas o certo é que a cartomante adivinhara tudo. (a; adivinhara; tudo)
d) No dia em que deixou cair toda essa
vegetação parasita, e ficou só o tronco da religião,...(essa; parasita; ficou)
e) nra